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MUROS


Desde que parámos em Floreffe (Bélgica), que temos a sorte de ficar em lugares à beira-rio.

Temos a sorte de acordar no meio da natureza, convivendo com burros, ouriços, corvos, coelhos, esquilos, patos, e outras aves que não consigo decifrar.

Na ida para o centro da cidade, as cores do outono continuaram a inundar o nosso caminho, relembrando-nos de que a vida é um ciclo e, por cima de nós, ramos despidos apontam o céu.

Desta vez apanhámos o autocarro e depois o metro.

Saltámos, num instante, para o meio urbano e soube tão bem!

Lembro-me de achar que Colónia foi uma lufada de ar fresco.

Andámos pelas ruas e atravessámos uma ponte cheia de promessas e desejos. O barulho metálico do comboio, que também a atravessava todos os dias levando as gentes para a sua rotina, combinava tão bem com as cores oxidadas dos cadeados.

Cadeados fechados, trancados. Dizem que simbolizam o amor. Tento acreditar, Cá para mim o amor não devia trancar, devia libertar. Devia, assim como as árvores, apontar na direção da imensidão, fazer-nos crescer.

Em Berlim havia um muro.

Um muro que trancava pessoas.

Um muro que dividia o mundo.

Em Berlim haviam corações separados, e não haviam cadeados que os juntassem.

Em Berlim quebraram o muro. Quebrar muros é muito importante!

Em Berlim, agora, há a lembrança daquele muro.

Um muro que, apesar de ser alto, não tem ramos que nos apontam o céu, nem folhas que nos lembram que a vida é um ciclo. (Que contraste imenso com as árvores do nosso caminho!)

Os muros interrompem os ciclos, e eu acho que é muito injusto! Os ciclos representam o amor e a esperança.

- Não Noa, este muro não é o mesmo da história. (“A Viagem” de Francesca Sanna) Existem mais muros e, infelizmente, não conseguimos transpor, nem derrubar, todos.

Continuei:

- A nossa viagem não é como a da história que a Cândida nos ofereceu. Temos sorte! Muita sorte por podermos escolher, por podermos ser livres de cair e renascer, como as folhas das nossas (e de muitas outras) árvores. Temos sorte porque os nossos muros, perto do muro de Berlim e de todos os muros cobertos de arame farpado que separam e estilhaçam vidas são, apenas, degraus.

Se os muros tivessem, em vez de arame farpado, ramos, podiamos trepar, agarrar, baloiçar, aproveitar a sua sombra, partilhar os seus frutos...

Mas as árvores são demasiado generosas para serem comparadas a muros, cujo arame cheio de farpas se enrola sobre si e nos repele.

Que bom que Berlim, hoje, é muito mais do que um muro! Nós vimos. nós sentimos.

É cultura, além de muita história. (digo-lhes várias vezes, que não se deve julgar um povo pelas decisões dos seus líderes)

Hoje há espaço para manifestar. De um lado das portas de Brandenburgo, contra a desativação das centrais nucleares, do outro, manifestavam-se para que fosse cumprida a promessa de instituição de um governo civil e democrãtico no Sudão.

Mas os meus filhos espantaram-se mais, ficaram chocados, com o muro, E eu, orgulho-me que se espantem, que se choquem.

A indiferença face às atrocidades da história assustam-me!





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